António José Telo continua a ser convidado para fazer comunicações
em agremiações de âmbito científico e, parece, estende-se-lhe uma passadeira vermelha para que possa
continuar a vender ou, às vezes, impingir, as suas interpretações sobre a
beligerância nacional, na Grande Guerra. Ele impôs-se o direito e a obrigação
de efectuar uma outra leitura dos acontecimentos de há cem anos, nem que para
tal tenha de fazer afirmações que rondam a mentira e sempre a distorção dos
factos. É o caso, logo no primeiro parágrafo do 7.º Erro, intitulado «Foi a Grã-Bretanha que pediu a formação do
CEP», da comunicação, que venho comentando, levada a efeito no XXIII colóquio
de História Militar, organizado pela Comissão Portuguesa de História Militar,
que lhe deu uma tribuna privilegiada para perorar sobre Portugal e a Grande
Guerra.
Diz assim o historiador Telo:
«A outra mentira da visão tradicional portuguesa é a de
querer fazer acreditar que foi a GB que pediu a criação do CEP, donde se pode
inferir que se houve algum erro de avaliação… ele foi britânico, por ter
exigido demasiado.»
Isto é falso! Tão falso que são os factos a desmentir a
afirmação. Basta pensar que a chamada Divisão
de Instrução foi criada em Tancos ainda se mantinham conversações em
Londres sobre a contribuição militar portuguesa no teatro de guerra europeu.
António José Telo, como é seu costume sobranceiro, tem feito
tábua rasa das minhas afirmações em Do
Intervencionismo ao Sidonismo, e tenta convencer-nos das suas razões. Eu
disse-o, em 1990, — Portugal e a Primeira
Grande Guerra. Os Objectivos Políticos e o Esboço da Estratégia Nacional. 1914 –
1916 — e reforcei em 2010: a beligerância nacional, bem como o envio do Corpo
Expedicionário Português (CEP) para França resultaram de uma manobra
diplomática portuguesa impositiva
perante a Grã-Bretanha. E nem se compreendia que não fosse assim se se quisesse
perceber que a beligerância visava um fim subtil: forçar a aceitação de
Portugal como parceiro igual e não menor da Inglaterra no areópago das Nações.
E é neste erro que António Telo continua a laborar e a induzir quem o lê e ouve,
porque ele olha a beligerância portuguesa à luz dos interesses britânicos e não
dos interesses nacionais. Ele é hoje um outro Brito Camacho ou um Machado Santos
de há cem anos.
Quando tenta explicar o tal 7.º Erro, por falta de alternativa e porque factos são factos, Telo
vê-se obrigado a referir o que realmente se passou, ou seja, uma manobra diplomática
excelentemente executada por Afonso Costa, tendo tido, às vezes sem saber, o
apoio da França. O ministro português, dito em linguagem pouco académica, encostou às cordas o Foreign Office e o ministro dos Negócios
Estrangeiros britânico, ganhando a batalha diplomática que a si mesmo se havia
imposto e imposto a Londres: fazer aceitar um contingente militar português no
teatro de guerra europeu, único local onde não passaria despercebida a
beligerância nacional e onde não poderia ser confundida com mera defesa de
património colonial e, assim, apoucada aquando da conferência da paz.
Telo, com subtileza não isenta de maldade, confunde dois
elementos que convém serem confundidos: a responsabilidade de Londres na
redução da eficácia do CEP com a exigência
demasiada da Grã-Bretanha!
Do que se culpa, e bem, a Inglaterra, é do facto de, em Setembro,
depois de ter posto em França o CEP, ter
cortado o transporte de mais tropas nacionais para França. Mas Telo quer
desviar as atenções dos Portugueses de hoje dessa real, dessa verdadeira culpa
britânica! E é culpa, porque foi esse o processo encontrado pela Inglaterra
para liquidar a ofensiva diplomática portuguesa! Deixar morrer o CEP em França
era, na perspectiva britânica, a forma de deixar bem relevante para a
posteridade a teimosia e a incapacidade de Portugal! Claro que, com
historiadores como António José Telo, o objectivo inglês de há cem anos é
alcançado hoje! Claro que com papalvos que convidam o historiador António José
Telo para bolsar veneno contra aqueles que, há cem anos, lutaram pela dignidade
internacional de Portugal, os objectivos ingleses acabam sendo alcançados!
Claro que, estejam onde estiverem, Afonso Costa, Norton de Matos, João Chagas,
Roberto Baptista, Ferreira Martins e, até Ferreira do Amaral, para não citar
Augusto de Casimiro ou, Jaime Cortesão, reviram-se dos pés para a cabeça ao
saberem das explicações de António
José Telo e jamais perdoarão a quem lhe dá tribuna para bolsar falsidades ou
distorções sobre o que realmente se passou.
A verdade é que o CEP
foi imposto aos britânicos, mas essa imposição teve em vista um valor mais
alto que está malevolamente a ser esquecido por António José Telo, quando até o
deposto rei D. Manuel II mandou que os monárquicos fossem beligerantes para
defenderem o interesse nacional português! E isto Telo não o diz! Esconde, deturpa,
escamoteia, para que a sua leitura
dos acontecimentos possa ser aquela que prevalecerá nos próximos cem anos,
confundindo os investigadores de 2116, que terão dificuldade em compreender quem
afinal estava a dizer a verdade histórica.
António José Telo não faz história! Continua a fazer
propaganda como a faziam os não intervencionistas de 1916!!!